6.5.08

Uma encomenda, por favor

Pra quem posso pedir presentes? Com quase meus dezoito anos na cara (não tão escancarados, devo dizer), não creio que Papai Noel ainda atenda aos meus pedidos. Antes sim, lembro-me bem, tantas vezes pedi presentes estúpidos, coisas de criança, e eu sempre ganhava o que queria. Não estou brincando, uma vez eu vi sua luva branca pela janela do quarto. Era um Natal como outro qualquer, mas ficou marcado por essa estranha presença. Também, primeira e última vez que tive provas reais da existência do bom velhinho. Imaginação minha? Pode ser, mas tenho a completa certeza de ter tido uma infância feliz e cheia de crenças tolas. Sonhos, meros sonhos, que hoje já não me satisfazem. Antes existisse Papai Noel...
O meu presente não é tão simples. Não quero uma boneca nova, como tantas outras vezes, nem uma viagem pra Disney, se pudesse ser mais ousada. Quero somente um amigo. Quem pode me presentear?
Isso mesmo, um amigo. Quero ter um amigo de "barriga da mamãe", daqueles que brincaram com você no cercadinho quando ainda usavam fraldas. E depois vocês foram pra mesma escola juntos, aprenderam a ler juntos, dormiam todos os finais de semana um na casa do outro. Os segredos eram sempre confessados, não importa quão embaraçosos, porque o outro sempre entendia; desde o chiclete roubado da padaria na semana passada até o primeiro beijo roubado na volta pra casa, numa tarde de verão. E a vida vai passando, e vocês vão crescendo juntos e a adolescência é aproveitada com uma vontade absurda de agarrar a vida, de brincar com ela. E passeios, viagens, telefonemas, noites de bebedeira, tudo vocês passaram juntos... E as responsabilidades vão chegando, as tristezas e agonias são compartilhadas nos ombros de ambos, sempre ali presentes para mesmo chorar juntos. Chega a faculdade e, mesmo que vocês não tenham escolhido o mesmo curso, ainda continuam se ligando todas as noites, para não deixar nenhum momento se perder, ser esquecido. E os filhos nascem, um se muda da cidade, e mesmo assim a amizade é mantida intacta, como uma flor bem cuidada numa redoma de cristal. Os anos chegam e, junto com eles, as rugas e as crises de identidade. Poderíamos ter feito muito mais da vida, não? Poderíamos ter aproveitado mais, não?
Na verdade, não. Porque aproveitamos juntos, nada mais poderíamos querer. E foi uma boa vida porque tivemos um ao outro... E fim da história! Entenderam agora? Eu quero um amigo.
Quero alguém para chorar minhas mágoas comigo, que me entenda independente de qualquer circunstância, que dê a vida por mim. Alguém que ria pra me fazer rir, que deixe de sair pra estudar comigo, que me convide pra fugir pra África porque também não aguenta mais o mundo. Um amigo, daqueles bem fieis, mais do que qualquer cão que já tenha pisado nessa terra, mais do que qualquer pessoa já o possa ter sido. Um amigo presente, sempre presente, mesmo quando eu não quero ver ninguém, mesmo quando a vida tenha me machucado tanto a ponto de eu querer fugir dela. Mas dele eu não fugiria, isso não... Porque ele é quem conhece todos os meus motivos e é a única pessoa que pode me convencer a ficar; e mesmo assim, se eu ainda quiser ir embora, ele se dispõe a ir comigo, porque não podemos ser separados. Quero um anjo da guarda, uma estrela guia, uma força, alegria. Quero de presente alguém cujos sonhos sejam tão grandes quanto os meus, para que possamos sonhar juntos.
O sonho na solidão é sonho pela metade, é sonho quase impossível. É sonho, somente sonho. E sonhos podem ser distruídos a qualquer momento, por qualquer facada. Assim como as que destroem os meus...